Entrevista de Miguel Fazenda a Miguel Fazenda
Nas poucas vezes que dei entrevistas confrontei-me com alguns casos em que a entrevista nem sequer tinha sido preparada, em que as perguntas eram desinteressantes e não estimulavam a criatividade das minhas respostas. Até já cheguei a escrever textos sobre mim mesmo, que depois vejo publicados e assinados com outro nome. Já enviei fotos para divulgação de exposições, que depois também aparecem assinadas por outro fotografo.Tentei fazer uma entrevista a mim mesmo, para focar algumas coisas de que gostaria de falar. A verdade é que isto que escrevi a seguir é apenas uma ínfima parte de uma extensa entrevista que gostaria de publicar aqui no Blog, mas como acho que ninguém se ia dar ao trabalho de ler, só escrevo isto. Fico à espera que algum jornalista me contacte para escrevermos o resto da entrevista. Por favor deixem comentários a esta estrevista.
Pergunta: Idade?
Resposta: 29 anos.
Pergunta: Fazer o Ensino Secundário numa escola de Fátima influenciou a escolha do curso a seguir na Universidade?
Resposta: O facto de a escola ser de Fátima não influenciou, mas os colegas e professores, que tive, influenciaram bastante no facto de ter escolhido seguir Pintura.
Pergunta: E viver em Fátima influencia a sua pintura?
Resposta: De modo nenhum. Não tenho qualquer tipo de relação com a Igreja Católica, seja espiritual ou profissional. Em algumas das minhas telas até revelo criticas bastante duras a determinadas maneiras de pensar, da Igreja.
Pergunta: Recentemente, numa entrevista à Revista Municipal de Ourém, referiu não gostar das obras de arte que se encontram na nova igreja do Santuário. É verdade?
Resposta: Sim, é verdade. Existem vários motivos para eu não gostar das obras do Santuário. Em primeiro lugar, acho que deveriam ter sido contactados artistas portugueses em vez de estrangeiros. Quando falo em artistas portugueses refiro-me a pessoas com formação e com obra de qualidade, ou promissores artistas. Não estou a falar de “curiosos” que fazem umas esculturas ou pinturas e que não percebem nada de arte nem de história de arte. Portugal tem excelentes escultores e pintores que vivem explorados pelas galerias de arte e que precisariam bastante de encomendas da dimensão das obras da Igreja da Santíssima Trindade.
Pergunta: Mas é só uma questão de nacionalidade dos artistas?
Resposta: É obvio que não. As várias esculturas que estão em redor da igreja não me desagradam e não posso comentar. A Cruz Alta é de mau gosto. Lembro-me de ver o artista, na televisão, a dizer que ia ser uma obra polémica e que os peregrinos mereciam uma cruz com um corpo. Sinceramente, acho que a ideia de fazer a cruz com ferros contorcidos está interessante, mas o resultado final poderia ser muito melhor. Penso que qualquer estudante de escultura das Belas Artes conseguiria fazer bem melhor.
Pergunta: E no interior?
Resposta: Antes de chegarmos ao interior, embirro bastante com aquela porta principal. Ao longo da história apareceram portas lindas, desde o Renascimento, até às portas feitas pelo Rodin. Eu próprio teria feito um projecto e maqueta para aquelas portas, gratuitamente. Adorava receber esse tipo de encomenda. Julgo que faria algo bastante mais vistoso e interessante. No interior salta à vista o Cristo que está pendurado por cima do Altar-mor. Não tem expressão, anatomicamente deixa muito a desejar e tem uma cara horrorosa. A cabeça parece dum palhaço (com todo o respeito para com os palhaços). Quanto ao retábulo, acho que também não está bem conseguido, As figuras não tem qualquer tipo de expressão e não transmitem nenhuma mensagem. De que vale a arte, se não transmite sentimentos?
Pergunta: O Miguel, nos últimos dois anos, conseguiu ganhar alguma visibilidade no mundo das artes. Como conseguiu?
Resposta: Visibilidade? Eu costumo dizer que sou um medíocre pintor de província. Os meus amigos é que costumam elogiar bastante o meu trabalho, e eu agradeço-lhes muito esse apoio. Tenho feito algumas exposições pelo país, mas isso não quer dizer que seja apoiado ou reconhecido pelo mercado da arte. As exposições que tenho feito têm sido em espaços públicos, nomeadamente Galerias Municipais. Quanto às galerias que me poderiam ajudar a ter alguma visibilidade, não querem saber do meu trabalho. A grande maioria das galerias de arte de Lisboa e Porto já receberam o meu portfólio e já viram trabalhos meus, mas isso não lhes interessa. São mais importantes trabalhos abstractos que se vendem bastante bem. Não lhes interessa apostar num artista que procura novos horizontes na arte figurativa. As poucas galerias que aceitaram ter trabalhos meus, têm-nos em acervo a “ganhar pó”. Posso agradecer à Galeria 57, de Leiria, que me tem ajudado bastante e que me trata como um artista de “primeira linha”.
Pergunta: É possível a um Artista Plástico, em Portugal, viver só da Arte?
Resposta: Julgo que sim, mas não é uma tarefa fácil. É preciso ser “poupadinho” e ir à procura de clientes e espaços para expor.
Pergunta: Então o mundo da arte é um mundo com bastante desonestidade?
Resposta: Infelizmente é verdade, e quem fica a perder são os artistas pouco conhecidos, que para além de serem obrigados a vender barato, têm de dar 50% à galeria.
Pergunta: Na sua pintura conseguem distinguir-se várias influências. Existe algum artista que o influenciou particularmente?
Resposta: Na verdade existem muitos pintores que me influenciaram muito, principalmente a nível teórico. Acho piada, que, quando coloco “dentro” das minhas telas uma pintura de outro artista, ouço comentário do género: “Têm influência do Klimt, ou do Francis Bacon, etc” e eu respondo que não tem influencia, que é mesmo uma cópia dentro da minha tela. É uma homenagem. Julgo que a minha pintura é uma mistura de influências e de vivencias.
Pergunta: Defina-me a sua pintura?
Resposta: Essa é aquela pergunta clássica…Bem… A minha pintura é a minha vida. Está repleta de momentos altos e baixos. Experimentações e influências dos clássicos. É uma pesquisa e uma representação do ser humano e do seu interior. É uma exploração do “eu”, da precariedade da vida. Representa solidões, gritos, personalidades, melancolias, etc. Se alguém que possuir uma tela cheia de informação, história, simbolismos, etc., pode encontrar isso nas minhas pinturas. Infelizmente o público só quer algo para colocar na parede e que as cores fiquem bem com o sofás e com os cortinados.
Pergunta: Acha que o povo Português tem cultura artística?
Resposta: Acho que não tem. Da minha curta experiência posso concluir várias coisas. Em Portugal não se aposta na cultura. Quando se aposta, as pessoas não aderem. As pessoas mais cultas normalmente são as que não têm poder económico para comprar pintura. Somos um povo que não tem dinheiro para nada, mas enchem-se estádios, fuma-se e bebe-se bastante. Acho que está tudo dito.
Pergunta: Estamos a terminar o ano. Qual foi o balanço de 2007?
Resposta: Em termos artísticos e profissionais foi o melhor ano da minha vida. Espero que 2008 seja igual ou melhor.
(…)
Os meus links